segunda-feira, 28 de abril de 2025

Terra de Ninguém texto de 2017 ler sem anacronismo

 

Terra de Ninguém
Por Pedro Claudio Rosa

Num país onde a corrupção corre solta e a indignação popular é incapaz de reparar os danos infligidos aos cofres públicos, onde a revelação do crime não conduz à punição, mas a benefícios — prisão domiciliar em mansões, privilégios em celas confortáveis, com boa alimentação, entretenimento, banho de sol e convivência amistosa entre os encarcerados —, não se pode falar em seriedade.

Num país onde o trabalhador carrega nos ombros o fardo dos crimes de colarinho branco, onde as leis, sob o pretexto de justiça, são moldadas para perpetuar os privilégios dos ricos; onde se contribui por toda uma vida para uma aposentadoria que talvez nunca chegue; onde os pobres, nas filas dos hospitais públicos, são tratados com descaso e desumanidade — aqui, não há espaço para a esperança.

Aqui, igrejas erguem templos monumentais em nome de Deus, enquanto exploram a fé do povo, assegurando conforto e prestígio àqueles que deveriam ser apenas servos. Sob o manto da liberdade religiosa, instala-se a impunidade, e enganar o próximo torna-se prática cotidiana, sempre sem castigo.

Nesta terra do faz de conta, a transparência é opaca, a torpeza é uma promessa de futuro, o grito morre no vazio, a fé ilude, e a vida vale tão pouco quanto a bala de uma arma ou o corte sujo de uma faca.

Revolução? Para quê? Revoltar-se? Para quê? A quem recorrer?

Aqui, os salvadores da pátria tornam-se algozes; os heróis, vilões; os santos, demonizados; e os sonhos, pesadelos.

Despertar? Jamais! Acordar?... Não há esperança nesta terra de ninguém. Aqui, a vida pende sempre por um fio, e cada vintém pesa mais do que a dignidade.

Pedro Claudio Rosa
Um ninguém na multidão
Iporá, Goiás, 12 de novembro de 2017

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